Cinco organizações não governamentais (ONGs) brasileiras realizaram uma missão na China para fortalecer as alianças técnico-científicas no combate às mudanças climáticas. Foram promovidos encontros com universidades, institutos de pesquisa e órgãos governamentais chineses.
A missão esteve em Beijing de 16 a 20 de junho sob o lema “Ampliando a cooperação Brasil-China na promoção do desenvolvimento sustentável” e foi organizada pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e pela organização filantrópica Instituto Clima e Sociedade (iCS), com a participação do Imazon, Plataforma CIPÓ, Instituto Centro de Vida (ICV) e o Instituto O Mundo Que Queremos.
“Proteger a Amazônia é central para o clima e para a segurança alimentar do planeta. Brasil e China são grandes parceiros comerciais e compartilham uma visão de cooperação Sul-Sul. O que nós viemos fazer aqui é compartilhar informações científicas para aproximar ainda mais essa relação”, diz André Guimarães, diretor executivo do IPAM e enviado especial da Presidência da COP30 para a sociedade civil.
A viagem ocorre em um ano de especial relevância para as relações bilaterais. Em 2024, o Brasil e a China comemoraram 50 anos de relações diplomáticas, com uma agenda reforçada pela presidência brasileira do grupo BRICS e pela próxima 30ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP30), que será realizada em novembro na cidade brasileira de Belém.
“Está claro o desejo compartilhado de seguir trabalhando juntos, e é fundamental para que essa cooperação seja baseada em uma premissa sustentável de longo prazo”, destacou Olivia Zerbini, analista de pesquisa do IPAM e uma das articuladoras da missão.
A diretora programática do iCS, Thais Ferraz, ressaltou que o objetivo da visita foi “fortalecer a capacidade das organizações brasileiras de desenvolver e implementar estratégias e atividades que promovam a cooperação entre o Brasil e a China em prol da sustentabilidade”.
Segundo Ferraz, os encontros permitiram identificar oportunidades de colaboração futura em pesquisas, intercâmbios técnicos e ações conjuntas.
Um dos momentos iniciais da missão foi um workshop com mais de 25 instituições chinesas, incluindo universidades como Tsinghua, Renmin e a Universidade Agrícola da China, bem como as academias de Ciências Agrícolas e Ciências Sociais.
Durante a semana, as ONGs brasileiras também se reuniram com representantes do Ministério da Ecologia e Meio Ambiente, da Comissão Nacional de Reforma e Desenvolvimento, do Centro de Cooperação Internacional e da Coalizão Verde da Iniciativa Cinturão e Rota.
“O que ficou estabelecido nesta viagem é que os diferentes segmentos da sociedade chinesa, sejam governo, academia ou indústria, têm muito interesse em dados sobre a relação da produção agropecuária com as florestas e com a disponibilidade de água. Querem dados porque entendem a relação da sustentabilidade da produção agropecuária com as mudanças climáticas, mas também, e sobretudo, se preocupam muito quanto à segurança alimentar”, disse Alice Thuault, diretora executiva do ICV.
Um dos principais focos da agenda foi a relação entre produção agrícola e clima. De acordo com uma pesquisa do IPAM apresentada durante a visita, se as temperaturas continuarem aumentando, cerca de 70% das terras agrícolas no centro-oeste do Brasil poderão ficar fora das condições ideais para o cultivo.
Na mesma linha, o pesquisador associado do Imazon, Paulo Barreto, destacou como as decisões do mercado chinês influenciaram a pecuária brasileira, como no caso do “Boi China”, uma categoria de carne bovina que segue os padrões exigidos pelo país asiático. “Se adicionarem critérios na área ambiental, há potencial para essa influência ser ampliada positivamente. Há um interesse muito grande em cooperação em diversas áreas, especialmente nas universidades, com relação também à inteligência artificial – algo que pode beneficiar diversos setores no Brasil”, afirmou.
A missão também incluiu visitas de campo, como a uma fazenda orgânica de vegetais em um distrito piloto para agricultura ecológica na capital chinesa. Com uma produção anual de 3 mil toneladas, a fazenda abastece diretamente restaurantes e supermercados locais, servindo como exemplo de práticas agrícolas sustentáveis.
Mariana Rondon, diretora de programas da Plataforma CIPÓ, destacou que compartilharam boas práticas brasileiras para a proteção de biomas e aprenderam com a experiência chinesa de transição ecológica acelerada, baseada em inovação e inclusão. Discutiram também as interdependências entre as economias e o potencial de parcerias mais sustentáveis, segundo ela.
Alexandre Mansur, diretor de projetos da ONG O Mundo Que Queremos, apontou um “alinhamento surpreendente” entre o Brasil e a China sobre a visão da natureza como infraestrutura garantidora da produção de alimentos. “Estamos construindo bases para pesquisas conjuntas e trabalhos em sinergia para a segurança alimentar de ambos os países”, afirmou.
A missão contou com o apoio da consultoria BellaTerra, liderada pela especialista Isabel Nepstad.
“Os diálogos com os stakeholders chineses representaram exatamente o tipo de cooperação necessária – uma parceria estratégica, baseada em ciência, para transformar compromissos climáticos e ambientais em ações concretas”, avaliou Nepstad.
O IPAM continuará desenvolvendo uma agenda na China até 30 de junho, com atividades programadas também em Shanghai e Hangzhou. As organizações planejam novos encontros nas próximas semanas para definir os detalhes dos projetos conjuntos que deverão ser desenvolvidos a partir do aproximação promovida nesta missão.
Fonte: Portuguese News